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Do Clínquer ao Concreto: Caminhos para a Neutralidade de Carbono no Setor de Construção

Viaduto feito com concreto de baixo carbono na Colômbia

O concreto está intrinsecamente ligado à industrialização e urbanização modernas: desde a Revolução Industrial, o material foi empregado na construção de fábricas, estações de trem, canais, estradas, pontes e docas para armazenar e escoar a produção industrial em ascensão. Com o crescimento das cidades, o concreto foi usado na construção de moradias e edifícios, por ser durável, resistente ao fogo e à água e produzido a partir de matérias-primas abundantes.

Hoje, a produção mundial anual de cimento é de cerca de 4,2 bilhões de toneladas e projeta-se que poderá alcançar 6 bilhões de toneladas até 2050.

Devido ao fato de queimar combustíveis fósseis nos fornos de cimento, mas principalmente devido ao processo de descarbonização na fabricação de cimento, a indústria cimenteira mundial contribui com cerca de 7% das 55 bilhões de toneladas de gases do efeito estufa emitidos anualmente.

Desde 1999, este fato é reconhecido pelas próprias cimenteiras reunidas na Iniciativa Cimenteira para a Sustentabilidade (CSI), que criou um protocolo para medir e reportar as emissões de dióxido de carbono de seus membros, e lançou um sistema de coleta de dados (GNR, na sigla em inglês: Getting the Number Right) sobre o desempenho das plantas de cimento em termos de emissões de CO2 e consumo de energia, não restrito aos seus membros, mas aberto a todo o setor cimenteiro.

Atualmente, a Associação Global de Cimento e Concreto (GCCA), formada por 50 companhias de cimento e 30 associações do setor cimenteiro e concreteiro, persegue os caminhos tecnológicos traçados no Roadmap 2021 para zerar suas emissões líquidas de carbono até 2050.

Rotas tecnológicas da descarbonização do cimento

São quatro rotas tecnológicas de mitigação das emissões de carbono na indústria do cimento. A mais importante delas é a substituição de clínquer por materiais cimentícios suplementares e fíleres calcários na fabricação do cimento.

A substituição de clínquer por escórias de alto forno e cinzas volantes nos diferentes tipos de cimento vem acontecendo desde a década de 1970, impulsionada principalmente pela crise do petróleo de 1973. Esses materiais cimentícios suplementares (SCM), subprodutos das indústrias siderúrgica e termelétrica, economizam energia térmica na medida em que dispensam em igual proporção a produção de clínquer pela cimenteira. Adicionalmente, seu uso contribui também para mitigar as emissões de carbono advindas da descarbonização do calcário para produzir clínquer.

O uso desses SCMs é limitado, porém, por sua disponibilidade mundial e regional. Recentemente, as pesquisas mostraram a viabilidade técnica do uso de argilas calcinadas e de fíleres calcário, de produção abundante, na substituição do clínquer no cimento.

O Roadmap 2021 projeta o potencial de abatimento de 9% das emissões previstas para 2050 com o uso dos SCMs no cimento. Autores, como Karen Scrivener, projetam um potencial bem maior, de cerca de até 35% (veja entrevista com a pesquisadora na edição 119 da Revista CONCRETO & Construções).

As outras rotas tecnológicas para mitigar emissões de carbono na indústria cimenteira são: maior eficiência energética dos fornos de cimento, com o uso das mais modernas tecnologias; o uso de combustíveis alternativos aos combustíveis fósseis, como pneus inservíveis, resíduos domésticos e industriais, e biomassa; e a captura, uso e estoque de carbono (CCUS), que consistem em tecnologias de sequestro do CO2 à medida que é emitido na planta de cimento, liquefação e transporte por meio de dutos, e, por fim, no seu armazenamento no subsolo, como em poços vazios de petróleo, ou seu uso na produção de compostos químicos rentáveis.

Somando-se os abatimentos de carbono pela substituição de clínquer, maior eficiência energética e uso de combustíveis alternativos, chega-se ao potencial estimado de 20% das emissões mundiais de dióxido de carbono previstas para 2050, ou seja, cerca de 760 milhões de toneladas.

Isto significa que o mapeamento tecnológico mais recente da indústria cimenteira delega 80% do abatimento previsto para se atingir emissões líquidas nulas em 2050 ao setor de produção e uso do concreto, e à implementação de tecnologias de captura, uso e armazenamento de carbono.

Rotas tecnológicas da descarbonização da construção

As rotas tecnológicas de mitigação de emissões de dióxido de carbono na produção e consumo de concreto apontam para a industrialização do setor, a pesquisa e desenvolvimento do concreto e a desmaterialização do projeto estrutural.

A industrialização da construção está relacionada com a maior racionalização no uso de recursos materiais e energéticos. Ela pode envolver, por um lado, o desenvolvimento de concretos especiais, com menor quantidade de cimento, e assim, com menor impacto no potencial de aquecimento global. Por outro, ela pode promover a desmaterialização do projeto estrutural, quando este opta por soluções com menores impactos ambientais.

Estudos têm consolidado pouco a pouco os resultados das diversas estratégias possíveis nessas rotas tecnológicas, normas e manuais têm sido estabelecidos e ferramentas de cálculo têm sido desenvolvidas e aplicadas. Apesar das incertezas, o Roadmap 2021 prevê que o potencial global de redução das emissões de carbono nessas rotas deve ser de 7% em 2030 e 22% em 2050, alcançando o abatimento da ordem de 840 milhões de toneladas.

Sobre o Autor

Fábio Pedroso
Jornalista no Instituto Brasileiro do Concreto (IBRACON) Editor da Revista CONCRETO & Construções Administrador e redator do Blog CONCRETO

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